EspeciaisGames

Conhecendo a Dissonância Ludonarrativa nos games

Antes de começarmos, gostaria de lembrar que para total compreensão do texto a seguir é recomendável a leitura do artigo “Introdução a teoria narrativa nos games”, postado há pouco tempo aqui na GameHall. Para tal, basta clicar AQUI.

Apesar de pomposo, o termo Dissonância Ludonarrativa é de simples compreensão, uma vez que se conheçam os eixos narrativos que compõem a estrutura narrativa de um produto do entretenimento eletrônico.

O termo foi cunhado pela primeira vez por Clint Hocking, em uma “blogada” no ano de 2007. Clint é um game designer que já trabalhou, entre outros, para a UbiSoft Montreal. Participou no desenvolvimento de games como Splinter Cell e Far Cry 2.

É possível conhecer mais sobre Clint por intermédio de seu blog pessoal, o “clicknothing”. Blog esse em que o game designer usou pela primeira vez o termo Dissonância Ludonarrativa. Para ler o texto original na íntegra, clique AQUI.

Bioshock_series

Em resumo, Clint analisa o primeiro Bioshock no que tange sua estrutura narrativa. Ao longo do texto ele cria argumentos que comprovariam que a Narrativa Emergente (ou Ludonarrativa) do game entra conceitualmente em desacordo para com a Narrativa Embutida. As atitudes tomadas obrigatoriamente pelo jogador ao longo do game são dissonantes ao estabelecido pelo canon do storyline apresentado. Daí o termo Dissonância Ludonarrativa.

No caso de Bioshock, enquanto a Narrativa Embutida desenvolve um tema altruísta a Narrativa Emergente segue o oposto disso, promovendo ações e desenvolvendo dinamicamente um tema egoísta. Essa quebra entre ambas as narrativas cria a Dissonância e isso por consequência quebra a imersão do jogador para com o jogo.

O termo possui, como tudo no mundo, seus defensores e seus hatters. Quem o defende diz que realmente ambas as narrativas devem caminhar juntas para proporcionar uma maior imersão ao jogador e que para tal roteiristas e desenvolvedores devem trabalhar mais próximos. Quem não concorda com o termo defende que o gameplay não deve ser subordinado a mais nada em um game e que suas regras devem se focar tão somente na progressão dinâmica e interativa do jogo.

Selecionemos um game mais atual e em que fica mais evidente a questão da Dissonância Ludonnativa: Tomb Raider (2013).

TombRaider_hero_Survivor

Nesse reboot da franquia Tomb Raider, acompanhamos a origem da Lara Croft aventureira e indomável que todos conhecemos desde sempre. Ao início do jogo nos é apresentada um Lara Croft inocente em uma importante missão arqueológica. Infelizmente um desastre acontece, fazendo com que Lara e toda a equipe arqueológica fiquem naufragados em uma misteriosa ilha.

Dentro do universo desse reboot, os acontecimentos que guiarão as ações de Lara criarão os alicerces, de maneira gradativa, da uma Lara Croft aventureira e indomável. Em suma, é uma história de origem.

Ao longo da jogatina a Narrativa Embutida está sempre mostrando o quanto Lara é inexperiente para com a situação extrema de sobrevivência que está vivenciando.

Quando Lara encontra pela primeira vez um cervo e possui um arco e flecha, ela sofre por ter de matar o animal e se alimentar. No primeiro momento em que Lara se vê obrigada a matar um ser humano para sobreviver, ela chora horrores por ter tido de tirar uma vida, mesmo sabendo que essa era a sua única alternativa. Esse tipo de momento dramaticamente carregado traz consigo uma grande riqueza na construção psicológica de um personagem e por certo isso é muito explorado nesse Tomb Raider.

Enquanto a Narrativa Embutida do jogo está construindo gradativamente o personagem, a Narrativa Emergente entrega algo destoante a isso.

Logo após a tocante cena do cervo, é possível fazer Lara se tornar a maior inimiga do greenpeace, matando tudo que é animal do jogo. Imediatamente após Lara matar um ser humano pela primeira vez, em um momento de enorme carga dramática, ela se torna uma mistura de Rambo com o predador, eliminando hordas de inimigos e se esgueirando no ambiente como se uma experiente combatente o fosse.

Em um momento Lara está conhecendo certos tipos de armas pela primeira vez e em instantes, sem prévia explicação ou desenvolvimento narrativo, está realizando upgrades nas mesmas a lá MacGyver.

Percebem o quanto as ações em gameplay são destoantes ao storyline que o próprio jogo conta?

Situações e games em que Narrativa Embutida e Narrativa Emergente apresentam algum desacordo não são poucos e deixo claro que isso não faz de um game bom ou ruim. São apenas conjecturas provindas de análise do tema Narrativa em games que se focam também no storyline. Um elemento a mais para ser analisado, mas não necessariamente problematizado, deixo claro.

E vocês leitores, acham importante conhecer os conceitos aqui apresentados? Concordam com o raciocínio de Clint Hocking que leva ao tema Dissonância Ludonarrativa? Não concorda? Acha que isso é uma bobagem desnecessária? Deixem seu comentário e até a próxima.

Eduardo Farnezi

De volta como contribuidor freelancer do site GameHall, um dos fundadores do não mais existente blog Canto Gamer, fundador do blog Gamerniaco e ainda atuante nos projetos do grupo Game Champz e Agência Joystick. Gamer por paixão, cinéfilo por vocação, leitor de mangás e HQs por criação e nerd pela somatória dos fatores. Acredita que os únicos possíveis cenários de apocalipse são Zumbis e Skynet e não sai para noitadas por medo do que Segata Sanshiro pode fazer se encontrá-lo.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo

Adblock detectado

Por favor, desabilite o Adblock para continuar acessando o site!