Nintendo patenteando até o ar que a gente respira nos games? A treta é séria, e pode respingar em todo mundo!
Seguinte, senta que lá vem história. A Nintendo, aquela mesma que a gente ama porque deu Mario, Zelda e Metroid, mas também odeia porque adora meter processo até em fã que faz joguinho de browser, resolveu brincar de patentear mecânica de jogo como se fosse a Coca-Cola guardando receita secreta. E, meus amigos, a parada é séria. Não estamos falando de “skin de personagem” ou “um jeito bonitinho de organizar HUD”. Estamos falando de invocação de personagens (tipo summons, pets, minions, ashes em Souls, necromantes em Diablo… tudo isso) e de troca suave de montarias.
Sim, os caras registraram duas patentes no USPTO (o órgão de patentes dos EUA):
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US 12,403,397 – descreve um sistema de “sub-personagens” que você invoca pro campo de batalha, e que podem lutar sozinhos ou sob seu comando.
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US 12,409,387 – cobre a troca de montarias em movimento, preservando estado e animação sem quebrar fluxo.
E adivinha quando isso foi aprovado? Agora, em setembro de 2025. Exatamente quando a Nintendo tá metendo processo no Palworld no Japão. Coincidência? Ah, tá bom…
A treta das patentes
A primeira patente é a mais cabeluda. Ela fala, em termos bem genéricos, de você invocar um bicho pra lutar por você. E não é só Pokémon, não. Pega Diablo (necromante invocando esqueleto), pega Elden Ring (ashes of war, summons), pega World of Warcraft (hunter com pet, warlock com demônio)… tudo isso poderia, no papel, cair nessa descrição. O problema é que a patente não fala só “pokébola” e pronto. Ela descreve a sequência de invocar, posicionar e deixar o boneco agir. É um escopo gigante.
Já a de montaria… cara, isso existe desde que o Link subiu na Epona no Ocarina of Time. O MMORPG mais meia-boca dos anos 2000 já deixava você trocar de mount. Mas agora a Nintendo tem um registro nos EUA dizendo que “essa transição suave é invenção deles”. Vai vendo.
Por que tá todo mundo pistola?
Porque isso não é só “defender o Pokémon do Palworld”. Isso pode virar munição pra processar qualquer um que use mecânicas parecidas. Vários especialistas já chamaram a parada de “falha embaraçosa do sistema de patentes”. O advogado Kirk Sigmon detonou, dizendo que isso não devia ter passado. O pessoal da Larian (sim, os donos de Baldur’s Gate 3) também já criticou esse tipo de patente como arma de má-fé.
E sabe o que é pior? O simples fato da patente existir já causa aquele “efeito resfriador”. Indie pequeno, que tava planejando um jogo com invocações, já fica com medo de tomar processo e desiste antes mesmo de começar. Quem perde com isso? Todo mundo, porque a gente deixa de ver jogos criativos nascerem.
Mas calma, tio Rumble, não é automático
É aqui que a coisa fica técnica. Patente não é baseada só no título ou no resumo bonito. O que vale são as claims (as reivindicações). É nelas que o juiz vai olhar linha por linha e perguntar: “esse jogo copia exatamente esse fluxo aqui?”.
Exemplo: se a patente exige que a invocação envolva um item-container tipo bola, com uma sequência específica de estados, pode ser que só Pokémon/Palworld caiam nessa malha. Outros jogos, que invocam via magia, runa, selo, já poderiam escapar.
Além disso, existe o tal do prior art (anterioridade). Ou seja, se você provar que alguém já fazia aquilo antes da data de depósito (março de 2023), a patente pode ser invalidada ou pelo menos ter o escopo reduzido. E, convenhamos, summon existe desde Final Fantasy de NES.
Quem se ferra primeiro?
Indie: vai morrer de medo de processo e talvez nem implemente mecânica parecida.
AAAs: têm grana pra bancar advogado, pedir reexame no USPTO, provar que isso já existia e até litigar por anos.
Nintendo: pode usar isso pra pressionar Palworld fora do Japão e quem sabe até arrancar acordos de licença.
Palworld como campo de teste
O processo contra a Pocketpair no Japão já fez eles mexerem em coisa no jogo. Agora, com essas patentes valendo nos EUA, a Nintendo tem mais uma arma na cintura. É bem provável que a estratégia seja justamente essa: escalar a briga pro mercado americano. Se colar, aí, meu amigo, qualquer estúdio que ousar mexer com “pokémon genérico” vai pensar duas vezes.
O que pode rolar daqui pra frente?
Design-around: devs mudam a forma como invocam pra fugir da patente. Tipo, em vez de “bola que abre e solta o bicho”, inventam um selo mágico que canaliza energia.
IPR/Reexame: advogados de outras empresas vão atrás de invalidar ou estreitar as claims, mostrando que já existia antes.
Licenciamento forçado: alguns podem preferir pagar pra usar, especialmente quem não pode se dar ao luxo de redesign.
Auto-censura: indies simplesmente desistem de tentar, porque não têm bala na agulha pra brigar.
E a bronca maior: propriedade intelectual nos games
Isso reacende aquela discussão eterna: até onde vai a proteção? Patente é pra coisa realmente nova, não pra mecânica que todo mundo já usa há 30 anos. Só que o sistema de patentes dos EUA, muitas vezes, aprova coisa que parece óbvia. Aí a treta só se resolve no tribunal ou no PTAB (o órgão que revisa patentes). Enquanto isso, a indústria toda fica em suspense.
Cenários práticos
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Nintendo usa como espada: processa Palworld, pressiona outros devs, consegue acordos. Mercado fica com medo.
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Patentes caem/estreitam: advogados provam que já existia e o escopo fica restrito a detalhes muito específicos (tipo “pokébola” mesmo). A treta perde força, mas até lá o estrago já foi feito.
Conclusão do tio Rumble
Olha, eu amo a Nintendo. Joguei Streets of Rage com música do Yuzo Koshiro no Mega Drive, chorei no final do Ocarina of Time e me empolguei com o trailer do Metroid Prime Remastered. Mas não dá pra passar pano quando os caras começam a patentear conceito genérico de gameplay.
Invocar bicho em RPG não é invenção de 2023. É tradição desde que o moleque magrelo do Final Fantasy chamava Bahamut pra fritar boss em 16-bits. Trocar montaria também não é novidade: eu já fazia isso em MMO obscuro coreano em 2004.
Então, bora ser claro: a Nintendo tem o direito de proteger suas criações? Tem. Mas usar patente genérica como porrete contra qualquer um é matar a criatividade. E a gente não quer uma indústria onde só dá pra invocar pet se tiver logo da Nintendo estampado.
No fim das contas, isso é menos sobre Pokémon vs Palworld e mais sobre até onde uma empresa pode ir pra controlar mecânicas básicas. E se esse precedente pega, imagina a FromSoftware patentear o “rolar pra desviar”? A Capcom patentear “cutscene de porta abrindo em Resident Evil”? A EA patentear loot box com animação brilhante? Aí acabou o videogame.