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Quem venceu a E3?

por Henrique Tozzi

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Embora esta pergunta pareça ter uma resposta bastante simples, talvez ela não esclareça o momento que estamos vivendo. E, para boa parte dos jogadores, talvez não seja a resposta que gostaríamos de ouvir.

Segunda-feira, dia 15 de junho de 2015 foi uma data marcante para muitos jogadores. Foi o dia das aguardadas Press Conferences da Sony e Microsoft. Aproveitando a onda do hype sempre criada em época de E3, as duas gigantes não decepcionaram milhões de pessoas que acompanhavam a feira e soltaram notícias bombásticas: a retrocompatibilidade do XOne, os anúncios de Final Fantasy VII Remake e Shenmue III, além de maiores detalhes sobre jogos aguardadíssimos, como Rise of the Tomb Raider, The Last Guardian, Kingdom Hearts III e Just Cause 3, para citar alguns.

Se abrirmos nosso leque de dias da E3, no domingo houve a primeira Press Conference da Bethesda, onde muito se falou sobre o ansiosamente esperado Fallout 4, e na terça-feira houve a apresentação – questionável – da Nintendo, assim como da Square Enix.
Só por este punhado de jogos e novidades já poderíamos considerar esta E3 um sucesso, e em particular os anúncios de Final Fantasy VII Remake e Shenmue III colocaram a internet em polvorosa: Final Fantasy VII ainda era trending topic do Twitter 12h após o fim da conferência, e a abertura do financiamento de Shenmue III no Kickstarter derrubou o site por aproximadamente 10 minutos. Somado ao cumprimento da meta de US$ 2.000.000,00 em menos de 12h (garantindo o recorde do Guinness de jogo que mais rápido alcançou a cifra de 1 milhão de dólares no Kickstarter – 102 minutos), este fato consuma o acontecido como um sucesso retumbante. Eu mesmo comemorava de maneira efusiva enquanto assistia aos anúncios.

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Mas o que estes acontecimentos estão nos mostrando e não conseguimos ver?

Ao que parece, atingimos uma espécie de barreira nos jogos. E esta barreira se refere as grandes novidades. Novidades de verdade.

Em um passado não tão distante, E3 significava o que de mais novo havia no entretenimento digital. As conferências eram aguardadas com muita ansiedade, e poucas novidades vazavam da maneira como acontece hoje (claro, os meios de comunicação 20 anos atrás operavam numa velocidade, digamos, reduzida). A E3 surgiu em uma época em que a tecnologia dos videogames caminhava a passos largos, juntamente com a mente dos grandes designers de jogos. O final da década de 90 viu não só a primeira parte da consolidação da E3 (que viria a se cristalizar na segunda metade dos anos 2000), como também apresentou aos jogadores os conceitos de novidades bombásticas – Mario em 3D? Um Zelda em que você anda pelos campos e monta um cavalo? E esse espião que pode matar todos os soldados inimigos, ou passar sorrateiramente por eles? Puxa, que visual de filme que este jogo tem!

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Pouco a pouco, os jogadores foram se acostumando a doses cavalares de inovações e anúncios bombásticos, vibrando a cada grande jogo ou exclusividade quebrada. Os memes estouraram nos últimos 5 anos, e neste mesmo período algumas apresentações sofríveis na E3 nos levaram a crer que o mercado havia atingido seu pico e estava começando a decair.

No entanto, eis que recentemente os apelos dos jogadores começaram a serem ouvidos, e o ápice destes clamores aconteceu este ano, com o anúncio de Final Fantasy VII Remake e Shenmue III separado por poucos minutos. Mas o que estes anúncios nos mostram?

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Penso humildemente que chegamos a um ponto importante na indústria, representado pela saturação de jogos e coisas que já vimos. Final Fantasy VII é um jogo de 1997 (completa 20 anos daqui 2 anos) e a promessa de seu remake já dura quase 10 anos (praticamente toda a era PS3). Se pararmos para pensar, nos últimos anos a franquia Final Fantasy foi explorada à última consequência. Mas vimos jogos realmente novos?

A resposta é não. Após o Final Fantasy XIII ser taxado por muitos jogadores e pela mídia especializada como um jogo medíocre, houve o lançamento do XIV, que foi tão mal recebido a ponto de precisar ser refeito para ter um re-lançamento no mínimo aceitável. Fora isso, tivemos lançamentos de Final Fantasy no Steam (que hoje tem os jogos III, IV, IV – The After Years, VII, VIII, XIII, XIII-2, XIV e Type-O HD – me perdoe se esqueci algum), bem como versões em Android e IOS, que contemplam, entre outras, as edições III, IV, V e VI. Ora, Final Fantasy era uma franquia até pouco tempo atrás sinônimo de console Sony, e de repente podemos jogar todas as suas iterações nas mais diversas plataformas. Isso nos leva a crer que a situação do mercado e, principalmente da Square Enix não deve ser das melhores.

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Ainda, será que Final Fantasy VII terá o remake que sonhamos? Em uma discussão com alguns amigos, chegamos à conclusão que o jogador de hoje não tem mais paciência para encontros randômicos tão comuns no original, e que sua história é tão bem amarrada que qualquer desvio pode desagradar os fãs mais puritanos. Como vão mexer no sistema de batalhas de um jogo tão querido? Vão fazer alterações na história a ponto de termos alguma nova experiência com este “novo” jogo? Poderemos finalmente salvar Aerith? Se pudermos, ela deve ser salva? Final Fantasy VII e sua carga emocional seriam honrados com essa escolha? Não é à toa que o remake ficou tanto tempo no faz-não-faz. É um terreno extremamente delicado, e qualquer deslize pode levar a uma reação negativa capaz de alcançar proporções catastróficas.

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Adicione a este raciocínio todas as continuações que vimos na E3: Just Cause 3, Uncharted IV, Assassins’s Creed Syndicate (que já é o 9º jogo na franquia), mais um Mario Tenis, Hitman (que já nem possui numeração), Rock Band 4, Call of Dutry Black Ops III… notaram os números a frente dos jogos? Isso porque não estou considerando Rise of the Tomb Raider e Fallout 4 que, digamos, não são filhos de tantas continuações.

A conclusão, ao que parece, é que não existe tanto espaço para inovação e/ou para a apresentação de algo realmente novo, fugindo dos padrões de jogos bem sucedidos. Cria-se algo com uma fórmula contendo elementos para garantir certo êxito, ou se “aposta” em conceitos que mal parecem jogos já estabelecidos, servindo como termômetro para ver a reação do público. Dreams, apresentado pela Media Molecule, foi tão abstrato que ainda está em fase de assimilação.

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Por outro lado, se alguns jogos altamente estimados pelos jogadores desejam ver a luz do dia e não parecem ser do tipo que gerarão lucros milionários, seusprodutores recorrem ao financiamento por parte do próprio jogador, através de ferramentas como o Kickstarter. Shenmue 3 foi o exemplo máximo disso, e Pillars of Eternity, continuação espiritual de Baldur’s gate 2, só foi possível graças ao crowd funding. No futuro próximo, também veremos Mighty No. 9, já que a Capcom insiste em não nos brindar com um novo Mega Man, assim como Bloodstained, o novo Igavania, já que a Konami não nos dá o prazer de um Castlevania 2D. Este movimento em direção ao Kickstarter não deve ser visto como algo negativo, muito pelo contrário. O financiamento por parte dos fãs dá ao produtor no qual confiamos total liberdade para fazer o jogo que queremos. Vemos ideias em execução que seriam impossíveis caso o financiamento viesse por parte das grandes produtoras. Contudo, a dependência do Kickstarter evidencia o quanto essas produtoras investem de maneira altamente controlada no desenvolvimento de novos jogos, buscando a certeza do retorno em detrimento de experiências inovadoras – isto porque nem entramos nos méritos dos jogos “inacabados” e na política de DLCs praticada atualmente.

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Claro, ainda há um campo onde a inovação aparece: o técnico. Não podemos deixar de nos empolgar com o que foi mostrado na demo de Uncharted 4 e sua física afiadíssima, ou o mundo aberto insano de Just Cause 3; os gráficos belíssimos de Rise of the Tomb Raider, e a experiência de vida que será Fallout 4. Mas nos próximos anos só isso não será suficiente – Destiny tem um ótimo gameplay multiplayer, porém não foi recebido tão bem quanto o esperado. Assassin’s Creed, jogo referência do fim dos anos ’00 tanto em termos de enredo quanto de gameplay, foi praticamente ignorado este ano. Ao que parece, somente evolução técnica não irá segurar as novidades pelos anos que estão por vir.

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Claro, tivemos duas boas novidades este com Horizon: Zero Dawn, que mostra um futuro bem diferente do que estamos acostumados a ver, com suas máquinas-animais, e uma demonstração mais robusta de No Man’s Sky (que foi apresentado ano passado), transformando o conceito de “Mundo Aberto” em “Universo Aberto”. Mesmo assim, pouca atenção está sendo dada a estes jogos pela mídia especializada, enquanto remakes e continuações preenchem as partes principais dos sites.

Com toda E3, há aquela empolgação no ar. Parece que estamos sempre esperando a catarse do momento no qual Shigeru Myamoto irá entrar no palco com o Hylian Shield e empunhando a Master Sword para anunciar uma grandiosa evolução em Zelda. Ou então o anúncio durante a conferência da Sega dizendo que o novo Sega Saturn já estava nas lojas, para momentos mais tarde descobrir que o concorrente PSX custaria $100 mais barato. Ou até mesmo a empolgante revelação do Kinect, que pegou todos de surpresa.

Os anúncios da E3 parecem viciar os que a acompanham todos os anos. Assim como a maioria dos jogadores que viu as grandes franquias surgirem nos anos 90, vibrei muito com a revelação de aguardados remakes e continuações. Pena que essa empolgação acompanhou um sentimento de grande pesar ao perceber não me surpreendi com nada novo, pois nenhuma novidade havia sido mostrada.

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Todos os anos a pergunta “Quem venceu a E3? ” é respondida em vários sites e revistas. No entanto, este ano penso que, de certa forma, não foram os jogadores que saíram vitoriosos, pois os acertos do passado parecem estar minando as novas ideias do futuro.

Sammy Anderson

Fundador do GameHall e produtor do programa Versus.

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