Análises

Rain

Apadrinhado pela Sony Japan Studios, a mesma que nos presenteou a pouco tempo com o belo “Puppeteer” (entre outras maravilhas), a expectativa para “Rain” era bastante alta, um jogo que consegue apresentar conceitos interessantes e diferentes, mas que peca pelo conteúdo raso, ou fazendo uma analogia apropriada, é uma chuvinha que nunca se transforma numa tempestade. Se não fosse por isso, o título seria mais uma pérola na rede PSN, com uma aventura poética e melancólica com potencial de encantar os jogadores mais exigentes. Confira em nossa análise abaixo os acertos e erros de “Rain”.

Fábula sob a chuva melancólica

Sempre achei o efeito de chuva algo visualmente muito belo, e até poético, durante filmes e jogos, pois cria uma atmosfera magnífica ao jogador. E isso, sem dúvida “Rain” consegue transmitir, pois o tempo todo está chovendo. O protagonista é um garoto sem nome, que está em eu quarto febril, quando vê pela janela uma menina na chuva. Seus olhos se encontram por um breve instante, e se não fosse a chuva delinear o contorno de seu corpo, a misteriosa garota seria completamente invisível. Mas ela não está sozinha, e sim fugindo de uma criatura tenebrosa, também visível apenas na água e nomeado mais tarde como o “Desconhecido“. Aflito por ajudá-la, o garoto num impulso de valentia decide ir em seu socorro e atravessa uma misteriosa porta, indo atrás das duas silhuetas. Ao chegar do outro lado, o garoto percebe que também está invisível, e que está numa cidade escura e sombria, com uma chuva que parece não ter fim. “Que lugar é esse? Porque ele está aqui? Porque ele está invisível? Quem é a garota?“. Para ter as suas respostas, é preciso encontrá-la, e ao mesmo tempo evitar as agressivas criaturas que só aparecem na chuva e o perseguem o tempo todo.

Simples e sem desafios

Assim começa o game, com uma introdução mostrada com charmosas imagens de aquarela que conseguem causar uma boa impressão, num estilo que lembra um conto de fadas (e mon-mon-monstros!) logo de cara. Afinal, depois de uma apresentação dessas, quem não vai querer continuar jogando para saber o que está acontecendo? O jogo inteiro é envolto em mistério, e aos poucos a bela história vai se revelando. Diferente de “Puppeteer“, aqui não há narrador, ou mesmo dublagem para os personagens. É tudo contado em forma de textos (disponíveis em português!), que vão aparecendo como parte dos cenários. Apesar de ser um jeito bacana de contar a história e ambientar o jogador, o pessoal se empolgou nos textos e eles aparecem em uma quantidade muito grande, as vezes só para dar dicar para o jogador, o que realmente não é necessário, dada a dificuldade baixa do game.

A mecânica do jogo baseia-se em controlar o jovenzinho pela estranha cidade, aparentemente situada na Europa durante o começo do século XX, por um caminho bastante linear e óbvio, o que é uma pena se você faz o tipo que gosta de explorar. Os seus comandos são simples, e utilizam apenas três botões: correr, pular e interagircomo abrir portas e acionar mecanismos. Não há armas, bombas, espadas, nem um pedaço de pau como em “Ico” – jogo que claramente “Rain” teve fortes inspirações – basta apenas resolver os puzzles. E aqui temos outro problema, nenhum desses quebra-cabeças são realmente desafiadores, é tudo muito simples e de fácil resolução. Faltou criatividade no design das fases, ou talvez isso tenha sido feito de propósito para se focar na história, mas o resultado final é uma aventura de três ou quatro horas apenas, o que para alguns jogadores pode ser muito pouco para se investir o seu rico dinheirinho.

Várias criaturas aparecem pelo caminho, que só conseguem visualizar o jovem galante quando ele está na chuva. Corra para debaixo de uma marquise ou um lugar onde não está chovendo, e as criaturas não poderão encontrá-lo e logo perdem o interesse. Não se preocupe que esses monstros não possuem olfato, e sua audição não é das melhores, mas mais adiante o elemento “barulho” pode ser usado para atrair a atenção delas. O tal do Desconhecido faz várias aparições durante o jogo, e sua presença sempre ameaçadora, causa uma atmosfera de tensão e apreensão que lembra bastante o Cabeça de Pirâmide de “Silent Hill“.

Apesar da mecânica simples, o jogo coloca elementos adicionais interessantes, como pisar numa poça de lama (ou cair completamente dentro de uma), o que o torna visível para os inimigos, mesmo debaixo de uma proteção, até conseguir se limpar. Em outro caso, há seres gigantescos que ficam vagando pelo cenário, e que servem de cobertura para o garoto se proteger da chuva e permanecer invisível para outros inimigos que estão por perto. São ideias interessantes e que agregam um desafio a mais na jogabilidade, mas que infelizmente são más ou pouco utilizadas durante o jogo, desperdiçando um potencial que poderia elevar consideravelmente o nível de desafio.

Apresentação artística impecável

Visualmente o jogo não chega a impressionar, os cenários em sua totalidade têm uma tonalidade escura e sombria, o que acaba cansando um pouco a vista, mas cumpre com o seu objetivo de nos transportar para uma história. Porém, “Rain” aborda uma visão artística bastante forte que pouco se vê em jogos de grande porte, e em certos momentos temos belas visões cinematográficas na tela da televisão, que ganham proporções com o ângulo das câmeras estrategicamente posicionadas.

A trilha sonora é simplesmente divina, que aliada ao visual artístico e a narrativa, fornecem uma experiência de imersão bastante surpreendente, especialmente nos momentos de tensão. Nas áreas mais calmas ouvimos uma suave e melancólica melodia, que acompanha o som dos passos do personagem e o barulho constante da chuva. Uma cena relaxante que pode mudar drasticamente com os grunhidos do Desconhecido e dos seus sons de destruição. As melodias têm como base a francesa “Clair de Lune“, uma das composições clássicas mais belas já compostas, com arranjos emotivos do compositor japonês Yugo Kanno, em seu primeiro trabalho com um game.

Como já dito, o fator exploração é praticamente inexistente, ao menos na primeira jogada. Após terminar o game uma vez ao longo de seus oito capítulos, são disponibilizados colecionáveis espalhados pela cidade numa segunda jogada. Todavia, a recompensa é pouca para se aventurar novamente, apenas se você quiser platinar o game. No contexto geral, é quase uma obra de arte nos games, mas ainda assim longe de chegar ao nível de um “Ico“, “Shadow of the Colossus” ou “Journey“.

Márcio Pacheco

Márcio Alexsandro Pacheco - Jornalista de games, cultura pop e nerdices em geral. Me add nas redes sociais (links abaixo):

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